CELEBRAÇÃO DOS 25 ANOS DE LUTA E RE-EXISTÊNCIA E BEM VIVER DOS QUIOMBOLAS DO CUMBE
Texto e edição:
Victor Santos
Publicado:
14 de dezembro, 2021
Entre os dias 03 05, Os Pescadores e Pescadoras Quilombolas do Cumbe/Aracati-CE, realizaram a celebração dos 25 anos das lutas e resistências, pela defesa do território quilombola contra ameaças de empreendimentos como eólica e carciniculturas, as principais responsáveis por vários problemas socioambientais. As demais como CAGECE, turismo de massa, especulação imobiliária, veranistas, e setores políticos, também se somam a essas ameaças. Além dessas mencionadas, também vivemos uma crise política, civilizatória em várias partes do mundo e não diferente aqui no Brasil, com um presidente abertamente contra as populações tradicionais, extinguindo ou aparelhando órgãos responsáveis pela implementação das políticas de regularização dos territórios tradicionais, para o uso coletivo dos quilombolas.
A celebração começou com a mística “tire suas mãos o quilombo é o nosso chão”, que contextualiza o discurso de geração de emprego que visam captar homens e mulheres, fazendo-os acreditarem que a pesca artesanal e outras práticas tradicionais já não podem garantir a renda e a alimentação para a comunidade, o que não corresponde, ao conversar com pescadores e pescadoras, que em seus relatos dizem, “embora toda a degradação, o rio e o manguezal ainda é o que garante alimentos e renda para uma grande parcela de pessoas na comunidade”.
Os 25 anos da “Luta Quilombola” no Cumbe, uniu muitos parceiros que se somaram, apoiando em vários segmentos, amplificando as vozes das mulheres, homens, jovens e adultos que fazem a luta e a resistência. E esse momento também foi para homenageá-los com agradecimentos e reconhecimento da importância dos apoios dos parceiros. Com as devidas vênias, João do Cumbe, idealizador da celebração, fez as instituições, que existem em função das comunidades e sobre o proceder de suas ações nesses territórios , “nada de fazer para elas, sem elas”.
Uma jangadinha de cabeça de talo e coqueiro feita pelo artesão Alonso do Cumbe, simbolizando a atividade da pesca, foi entregue aos representantes das instituições parceiras, parceiros autônomos, coletivos, e comunidades como o caso da comunidade de Sítio Canavieira que desde o início da luta e resistência se soma aos bons e ruins momentos no decorrer desses 25 anos.
Durante a homenagem à Menininha, pescadora e moradora da Vila da Volta em Aracati, abrilhantou a solenidade com a canção entoada pelo Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais - MPP, “Ninguém se engana, a nossa história já começou desumana”.
Na celebração, participantes da Congregação Igreja triunfal do Cumbe e da Congregação Missionaria da Sagrada família que sempre acompanha e apoia os movimentos sociais e organizações populares. E da Casa das Negas, trouxeram palavras de espiritualidade para a luta e para quem a encampa, num momento ecomênico.
A primeira noite se encerra com os parabéns aos 25 anos da Luta e Resistência ao redor do bolo de quatro metros de tamanho confeitado com as cores da bandeira que representa a Associação Quilombola, entidade representativa dos Pescadores e Pescadoras Quilombolas do Cumbe.
O segundo dia começou com um café comunitário bem reforçado, em seguida convidados e comunitários seguiram até o Remanso, local tradicionalmente utilizado para pesca e lazer da comunidade, para momento de integração entre as práticas da mariscagem, pesca e por que não, dançar um coco embalado pelas meninas da Casa das Negas, tomar banho nas águas do Jaguaribe e deliciar-se com a diversidade que o estuário desse rio nos oferece.
Ao retornar da vivência no Rio Jaguaribe, um farto almoço com frutos do rio, do mar e do mangue foi servido e às dezesseis horas foi o momento do primeiro batizado e trocas de cordas com o Contra Mestre Bentivi, o Professor Hulk e o Mestre Maurilio, em seguida uma roda de capoeira com os jovens praticantes do Quilombo do Cumbe. A noite seguiu com continuidade das homenagens e uma noite cultural.
O terceiro e último dia das celebrações também se iniciou com o café coletivo, e logo mais um campeonato de futebol soçaite no espaço Toca do Guaiamum, um dos parceiros da Luta e Resistência. Depois do almoço e algum tempo para descanso, uma festa dançante com forró e outros gêneros musicais para finalizar os três dias de atividades. Pois como diz a pescadora e participante do grupo que realiza o Turismo Comunitário, a Luciana Santos, “É nesses momentos que nos desopilamos um pouco, para seguir depois firmes na luta”.
Os homens e mulheres que fazem a Associação Quilombola do Cumbe, protagonizam uma série de ações em defesa do território, pois entendem que ele é parte de sua vida, um componente fundamental para sua existência. Nesse sentido as ações que são desenvolvidas ao longo desses 25 anos complementam-se, a garantir autonomia em decidir que tipo de desenvolvimento querem para a sua localidade, Soberania em recusar projetos que degradam o meio ambientes e causa conflitos internos, efetivação e fiscalização das políticas públicas que garantam créditos a juros baixos para a pesca artesanal, políticas previdenciárias que amparem o Pescador ou Pescadora quando estes forem ou estiverem impossibilitados de exercerem seus trabalhos, efetivação das políticas de regularização dos territórios tradicionais, garantindo lhes o título de uso coletivo, educação contextualizada que coloque a realidade local como matéria permanente para ser discutidas entre escola e comunidade.
Além dessas ações, muitas outras são desenvolvidas, como é o turismo comunitário que propõe outra relação entre visitantes e nativos diferentes do turismo convencional de massa. Os eventos culturais valorizam as práticas tradicionais ao mesmo tempo que deixam uma boa renda nos comércios locais e trabalhadores e trabalhadoras que prestam serviços durante as festas. A participação nas pesquisas desenvolvidas por estudantes de várias áreas do conhecimento contribuindo como sujeito do fazer científico.
O Quilombo do Cumbe se tornou uma grande referência ao denunciar o racismo ambiental e institucional na região de Aracati, e por isso têm sido perseguidos sistematicamente por setores do empresariado e políticos, mesmo assim o quilombo segue denunciando os abusos, como diz o João do Cumbe “É preciso não ter medo, é preciso ter coragem de dizer não”.